Militares reformados, denunciados em 2014, continuam a receber salários enquanto o caso avança na Justiça.
07 de Janeiro de 2025 às 22h25

Governo federal gasta R$ 140,2 mil mensais com militares acusados pela morte de Rubens Paiva

Militares reformados, denunciados em 2014, continuam a receber salários enquanto o caso avança na Justiça.

O governo federal destina mensalmente R$ 140,2 mil em salários e pensões a militares acusados pelo assassinato do ex-deputado federal Rubens Paiva, ocorrido durante a ditadura militar. Em maio de 2014, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou cinco militares reformados pela morte do engenheiro, e a Justiça aceitou a denúncia no mesmo mês, tornando-os réus. Desde então, três dos acusados faleceram, enquanto dois continuam vivos e recebendo remunerações do Estado.

O major Jacy Ochsendorf e Souza, da reserva do Exército, recebe um salário bruto de R$ 23,4 mil, o que, após descontos, resulta em um vencimento líquido de R$ 16 mil. Por sua vez, o general reformado José Antônio Nogueira Belham recebe R$ 35,9 mil brutos, resultando em R$ 31 mil líquidos após os descontos.

Além dos salários, o governo também destina pensões a oito familiares dos três réus falecidos, totalizando R$ 80 mil mensais. Assim, a soma dos valores relativos a salários e pensões dos réus pelo assassinato de Rubens Paiva chega a R$ 140,2 mil. Essa informação foi levantada pelo portal ICL Notícias, com dados disponíveis no Portal da Transparência.

Rubens Paiva teve seu mandato de deputado federal cassado com o golpe militar de 1964. Após seis anos de exílio, retornou ao Brasil em 1970. No ano seguinte, foi detido de forma arbitrária, torturado e assassinado nas dependências do Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) no Rio de Janeiro.

O drama da família do ex-deputado é retratado em “Ainda Estou Aqui”, um livro de memórias do jornalista e escritor Marcelo Rubens Paiva, um de seus filhos, publicado em 2015. A obra foi adaptada para o cinema por Walter Salles, e o papel de Eunice Paiva, viúva de Rubens, é interpretado por Fernanda Torres e Fernanda Montenegro, mãe e filha. Recentemente, Fernanda Torres foi premiada na categoria de melhor atriz em filme de drama pelo Globo de Ouro, a maior premiação da crítica de cinema.

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Em 1996, foi emitida uma certidão de óbito que reconheceu que Rubens Paiva morreu de forma “não natural, violenta e causada pelo Estado brasileiro no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial instaurado em 1964”.

Apesar do reconhecimento oficial, não houve punição para os responsáveis pela morte do ex-deputado. O principal entrave para a condenação é a Lei da Anistia, de 1979, que perdoou os “crimes” de perseguidos políticos pela ditadura, mas também acolheu a tese dos “crimes conexos”, o que, na prática, anistiou os militares envolvidos nas torturas e mortes promovidas pelo regime.

A Organização dos Estados Americanos (OEA), à qual o Brasil está associado, considera crimes de lesa-humanidade como “imprescritíveis e não anistiáveis”. Esse entendimento levou o juiz Caio Márcio Gutterres Taranto a aceitar a denúncia do MPF contra os militares implicados no assassinato de Rubens Paiva, afirmando que “a qualidade de crimes contra a humanidade do objeto da ação penal obsta a incidência da prescrição”.

O entendimento do juiz foi confirmado pela segunda instância em setembro de 2014. No entanto, um recurso dos réus ao Supremo Tribunal Federal (STF) paralisou a tramitação do caso. A liminar concedida pelo então ministro Teori Zavascki alinhou-se ao entendimento fixado pela Corte em 2010, que prevaleceu por 7 votos a 2, sustentando que a Lei da Anistia foi um acordo político para a redemocratização do país.

Embora tenha interrompido o processo, Zavascki permitiu a continuidade da coleta de provas. O ministro faleceu em um acidente aéreo em janeiro de 2017, e sua cadeira no Supremo foi ocupada por Alexandre de Moraes, que assumiu a relatoria do processo. Em novembro de 2024, Moraes encaminhou o caso à Procuradoria-Geral da República (PGR), que ainda não se manifestou.

Em abril de 2024, o Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) reabriu a apuração sobre o caso Rubens Paiva. Essa decisão não é meramente simbólica, pois o órgão pode requisitar documentos, ouvir testemunhas e produzir relatórios propondo sanções.

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