Polícia Federal investiga esquema de lavagem de dinheiro de emendas parlamentares em 51 municípios do Ceará, envolvendo o deputado Júnior Mano.
07 de Janeiro de 2025 às 06h46

Desvio de emendas no Ceará: vigia de R$ 2,4 mil abre empresa de R$ 8,5 milhões

Polícia Federal investiga esquema de lavagem de dinheiro de emendas parlamentares em 51 municípios do Ceará, envolvendo o deputado Júnior Mano.

A Polícia Federal (PF) está investigando um esquema de lavagem de dinheiro relacionado ao desvio de emendas parlamentares no Ceará, que teria como alvo as eleições de 51 municípios em outubro de 2024. No centro da investigação está Maurício Gomes Coelho, um vigia de 37 anos que recebe um salário mensal de R$ 2,4 mil e que, surpreendentemente, abriu uma empresa com capital social de R$ 8,5 milhões, a MK Serviços em Construção e Transporte Escolar Ltda.

De acordo com a PF, durante as diligências, não foram encontrados “elementos que justifiquem” a constituição da empresa por Maurício, que se tornou um dos principais alvos da Operação Camisa 7. A MK foi contratada por diversas administrações municipais, totalizando contratos que somam R$ 318,9 milhões.

A investigação sugere que Maurício atua como um “laranja” em um esquema que se espalhou por grande parte do sertão cearense. A PF recebeu uma denúncia no Ministério Público Eleitoral indicando que ele seria um intermediário de Carlos Alberto Queiroz, conhecido como “Bebeto do Choró”, prefeito eleito do município de Choró, que está foragido.

Bebeto é investigado por supostas ligações com o Comando Vermelho, uma facção criminosa que estaria controlando a compra de votos na região. A PF também aponta relações próximas entre Bebeto e o deputado federal Júnior Mano (PSB), que, segundo as investigações, estaria diretamente envolvido no desvio de emendas parlamentares que alimentariam o esquema de compra de votos.

Os detalhes sobre o papel de Maurício no organograma do grupo político foram revelados em um relatório da PF, datado de novembro, após a apreensão do celular do vigia. No dia 1º de janeiro, a Justiça Eleitoral suspendeu a posse de Bebeto, após a PF encontrar diálogos atribuídos a ele, incluindo um áudio em que o prefeito eleito “reclama do preço a pagar pelos votos, indicando que estava muito caro”.

O inquérito foi instaurado no final de setembro para investigar informações de que Bebeto, junto a empresários, estaria oferecendo dinheiro oriundo de atividades ilícitas, utilizando empresas constituídas em nome de laranjas para manejar recursos durante a campanha eleitoral, além dos limites de gastos estabelecidos para os candidatos.

A investigação ganhou força após a denúncia da ex-prefeita de Canindé, Rosário Ximenes, que afirmou que Bebeto enviaria dinheiro para cerca de 51 prefeituras e teria mais de R$ 58 milhões para gastar nas eleições. Em seu depoimento, Rosário ainda registrou que Bebeto financiaria carros, gasolina, brindes e a compra de votos, em troca de favores políticos, como a venda de serviços públicos.

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Rosário citou diretamente a MK Transportes, a empresa de Maurício, afirmando que ela pertenceria, na verdade, a Bebeto. A Promotoria então colocou a empresa sob investigação, levantando dados das licitações em que teria participado e contratos milionários com prefeituras cearenses.

Segundo a ex-prefeita, os recursos de Bebeto viriam de licitações e emendas parlamentares que ele negociava, apontando diretamente para Júnior Mano como o responsável por conceder as emendas. “Concede as emendas, manda pra ele (‘Bebeto do Choró’) e ele lava”, afirmou Rosário em seu depoimento.

A citação ao deputado Júnior Mano elevou o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os investigadores acreditam que o parlamentar exercia um papel central na manipulação dos pleitos eleitorais, tanto por meio da compra de votos quanto pelo direcionamento de recursos públicos desviados de empresas controladas pelo grupo criminoso liderado por Bebeto.

A MK e Maurício são considerados peças-chave do esquema, e a investigação está de olho em pelo menos outras sete empresas que também teriam contratos de grande valor com gestões públicas cooptadas pelo crime organizado. A PF está analisando todos os contratos firmados por essas empresas com municípios cearenses.

O rastreamento revela que a MK Serviços em Construção e Transporte Escolar Ltda. fechou contratos com 47 municípios, totalizando R$ 318.927.729,42. Em meio a essa investigação, a PF apreendeu R$ 600 mil em espécie, que havia sido sacado por um sargento da Polícia Militar, Emanuel Elanyo Lemos Barroso, “no interesse” de Maurício.

O dinheiro foi encontrado em um veículo de luxo, registrado em nome de um empresário que possui contrato de locação com a prefeitura de Milagres. O sargento relatou que havia feito saques a pedido de Maurício e que não via irregularidade em suas ações, uma vez que estava de folga e utilizava sua própria identificação para os registros.

Após diligências preliminares, a PF abriu a Operação Camisa 7 para realizar buscas nos endereços de Bebeto e na MK Transportes. Bebeto foi abordado em uma praia de Fortaleza, onde tentou se desfazer de seu celular ao perceber a aproximação dos investigadores. O aparelho foi recuperado, mas o prefeito se recusou a fornecer a senha.

Na sede da MK, a polícia encontrou uma máquina contadora de dinheiro e sacolas, o que confirma a circulação de dinheiro em espécie no local. A reportagem tentou contato com a MK e com os envolvidos, mas até o momento não obteve resposta.

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