Dados do Unicef mostram que acesso à educação e alfabetização pioraram desde 2019.
16 de Janeiro de 2025 às 15h15

Estudo revela que pandemia ainda afeta educação de crianças no Brasil

Dados do Unicef mostram que acesso à educação e alfabetização pioraram desde 2019.

Um estudo recente divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) aponta que o Brasil ainda não se recuperou dos impactos da pandemia na educação. O acesso à educação, que vinha apresentando melhorias, sofreu retrocessos durante a crise sanitária e ainda não alcançou os níveis de 2019. A alfabetização das crianças, que tiveram as aulas presenciais suspensas, também piorou, com um aumento significativo no percentual de crianças de 8 anos que não sabem ler e escrever entre 2019 e 2023.

O relatório, intitulado “Pobreza Multidimensional na Infância e Adolescência no Brasil – 2017 a 2023”, foi lançado nesta quinta-feira (16) e se baseia na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad C) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O estudo analisa as privações de acesso à escola na idade certa e a alfabetização das crianças.

Os dados revelam que, ao longo dos anos, houve oscilações no acesso à educação, com avanços e retrocessos, muitos dos quais ocorreram durante a pandemia. Em 2017, 8,5% das crianças e adolescentes de até 17 anos estavam privados de educação de alguma forma. Essa porcentagem caiu para 7,1% em 2019, subiu para 8,8% em 2021 e, em 2023, ficou em 7,7%. Ao todo, cerca de quatro milhões de crianças e adolescentes estão atrasados nos estudos, repetiram de ano ou não foram alfabetizados até os 7 anos.

O estudo também indica que existem 619 mil crianças e adolescentes em situação de privação extrema da educação, ou seja, que não frequentam a escola. Esse grupo representa 1,2% da população de até 17 anos, uma queda em relação aos 2,3% registrados em 2021, durante a pandemia, mas ainda inferior ao percentual de 1,6% de 2019.

No Brasil, a educação é obrigatória para crianças de 4 a 17 anos, conforme estabelecido pela Emenda Constitucional 59 e pelo Plano Nacional de Educação (PNE). A chefe de Políticas Sociais do Unicef no Brasil, Liliana Chopitea, destaca que “sabemos que na educação, leva-se muito mais tempo para recuperar os impactos. Essa faixa etária é a que mais sofreu e os dados mostram a importância de que se façam políticas mais focadas e se fortaleçam as que estão sendo implementadas”.

Em relação à alfabetização, a pesquisa revela que cerca de 30% das crianças de 8 anos não estavam alfabetizadas em 2023, um aumento em relação aos 14% registrados em 2019. O estudo sugere que as crianças que tinham entre 5 e 7 anos em 2020, e que, consequentemente, enfrentaram interrupções educacionais críticas durante a pandemia, estão lidando com danos persistentes em sua alfabetização. O ensino remoto e as dificuldades associadas a ele, como a falta de acesso a recursos educacionais adequados e suporte pedagógico, podem ter contribuído para essa defasagem significativa.

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Além disso, o estudo aponta uma disparidade maior entre as crianças que vivem em áreas rurais. Para crianças de 7 a 8 anos nessas localidades, o percentual de analfabetismo em 2023 atinge cerca de 45%, evidenciando uma grave deficiência no acesso ou na qualidade da educação inicial.

As desigualdades de aprendizagem também se refletem na renda das famílias. Em 2019, os 25% mais pobres da população apresentaram um percentual de analfabetismo de 15,6%, enquanto os 20% mais ricos registraram apenas 2,5%. Em 2023, essa diferença aumentou, com o quintil mais baixo passando para cerca de 30% e o quintil mais alto aumentando ligeiramente para 5,9%. O estudo ressalta que crianças de famílias de menor renda foram desproporcionalmente afetadas pelas interrupções na educação causadas pela pandemia, enquanto aquelas em situações econômicas mais favoráveis tiveram mais recursos para mitigar os impactos negativos no aprendizado.

A meta do Brasil, de acordo com a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), é que todas as crianças estejam alfabetizadas ao fim do 2º ano do ensino fundamental, ou seja, aos 7 anos de idade. Em 2023, o governo federal instituiu o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, com o objetivo de garantir o direito à alfabetização na idade certa e recuperar as aprendizagens das crianças do 3º, 4º e 5º ano do ensino fundamental afetadas pela pandemia.

O estudo indica que houve “progressos significativos” nos últimos dois anos. A taxa de analfabetismo entre crianças de 8 anos caiu de 29,9% em 2022 para 23,3% em 2024. Entre as crianças de 9 anos, a redução foi de 15,7% em 2022 para 10,2% em 2024.

“É urgente que se tenha políticas públicas coordenadas em nível nacional, estadual e municipal para reverter o problema do analfabetismo e retomar essa aprendizagem. Muitas políticas e programas estão sendo desenvolvidos nos últimos anos. Como vimos, leva mais tempo para recuperar o que foi o impacto da pandemia, mas é importante continuar investindo nesses programas, como, por exemplo, o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, que justamente tem como finalidade garantir o direito à alfabetização das crianças até o fim do segundo ano de ensino fundamental”, defende Chopitea.

Além da educação, o estudo analisou outras dimensões que considera fundamentais para garantir o bem-estar de crianças e adolescentes, como renda, acesso à informação, água, saneamento, moradia, proteção contra o trabalho infantil e segurança alimentar. Esta é a quarta edição da pesquisa realizada pelo Unicef.

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