
Terapia da rejeição: popularidade nas redes sociais pode afetar saúde mental
Método sem respaldo científico se espalha entre jovens que buscam lidar com a rejeição e a ansiedade.
Nos últimos meses, a chamada “terapia da rejeição” ganhou destaque nas redes sociais, especialmente no TikTok, onde diversos usuários compartilham suas experiências e afirmam que a prática os ajudou a enfrentar a ansiedade, melhorar a autoestima e até lidar com o medo. Contudo, essa abordagem carece de embasamento científico e consiste em expor os indivíduos a situações desconfortáveis que provavelmente resultarão em rejeição, seja no ambiente de trabalho, em transportes públicos ou em interações com desconhecidos.
A proposta é que, ao se deparar com um “não”, a pessoa possa reduzir o medo da rejeição. O objetivo é que, ao enfrentar essas situações de maneira controlada, o indivíduo se torne mais resiliente e confiante para lidar com fracassos ou a falta de aceitação.
Entre as situações constrangedoras sugeridas estão pedir dinheiro emprestado a um estranho na rua, solicitar um abraço em meio a uma multidão, cumprimentar desconhecidos no metrô ou até mesmo ir a uma cafeteria e pedir um item de graça. Na prática, no entanto, a pessoa não deseja realmente essas interações e não se importa com a resposta que receberá; o foco está em superar a barreira e realizar a pergunta, tudo registrado e compartilhado nas redes sociais.
Exposição não é sinônimo de rejeição


A “terapia da rejeição” é considerada uma versão simplificada da “terapia de exposição”, que é uma técnica reconhecida e amplamente utilizada por psicólogos no contexto da terapia cognitivo-comportamental (TCC) para tratar transtornos específicos, como a síndrome do pânico, fobias sociais, medo de voar e ansiedade generalizada.
Conforme o nome sugere, a terapia de exposição envolve a exposição gradual do paciente a situações que ele teme, visando diminuir sua resposta excessiva de medo por meio da dessensibilização. O processo normalmente começa com imagens e o uso de realidade virtual, antes que a pessoa se confronte diretamente com a situação ou objeto que teme. O psiquiatra Elton Kanomata, do Hospital Israelita Albert Einstein, explica: “O medo pode até persistir por um período, mas de uma forma mais controlada, diminuindo o nível de sofrimento”. Além disso, os pacientes costumam aprender técnicas de relaxamento para reduzir a ansiedade e a tensão.
Por outro lado, a terapia da rejeição não é um tratamento formal. O ato de filmar e compartilhar situações constrangedoras nas redes sociais pode, na verdade, agravar quadros de ansiedade em indivíduos predispostos. Kanomata observa: “A ideia de se expor a contextos muito bizarros não faz sentido. Seria mais útil se a pessoa se expusesse a situações do seu cotidiano para desenvolver habilidades sociais e socioemocionais. Passar vergonha sem necessidade é um desgaste emocional desnecessário e não traz ganhos”.
As consequências dessa prática podem se estender além do momento em que a pessoa ouve o “não” e é rejeitada. Ao publicar suas experiências nas redes sociais, o indivíduo se expõe novamente, sujeitando-se a julgamentos e críticas de inúmeras pessoas. “As novas gerações não estão acostumadas a ouvir ‘não’, e muitas buscam soluções rápidas e simplificadas. Se não obtiverem o engajamento esperado nas redes sociais e receberem comentários negativos, isso pode piorar ainda mais seu estado emocional”, alerta o psiquiatra.
Embora a “terapia da rejeição” possa parecer uma abordagem atrativa para quem deseja superar inseguranças, Kanomata enfatiza que ela não deve ser vista como uma solução imediata ou como substituto de tratamentos reconhecidos. “Para realmente trabalhar a questão da rejeição e da frustração, é fundamental que esse processo seja conduzido por um profissional que possa acompanhar o paciente ao longo das sessões, discutindo situações e ajudando-o a lidar com os desafios, evitando que ele se sinta mais ansioso ou desvalorizado”, conclui o médico.
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