Mudanças nos benefícios sociais geram polêmica no pacote fiscal do governo
Propostas do governo para o Benefício de Prestação Continuada enfrentam resistência no Congresso e geram debates acalorados.
Brasília - O pacote fiscal apresentado pelo governo federal, que inclui alterações significativas nos benefícios sociais, tem gerado intensos debates no Congresso. O projeto de lei que propõe mudanças no Benefício de Prestação Continuada (BPC), destinado a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda, foi o mais modificado durante as discussões na Câmara dos Deputados, com um total de 11 alterações propostas pelo relator, deputado Isnaldo Bulhôes (MDB-AL). Destas, dez estão diretamente relacionadas ao BPC.
Entre as principais mudanças, o relator rejeitou a definição de “pessoa com deficiência” que constava no projeto original do governo. Além disso, foram excluídos da regra de coabitação os rendimentos de familiares que não residem na mesma casa e a proposta que considerava a propriedade de bens ou direitos na concessão do benefício também foi descartada. A equipe econômica do governo tinha como objetivo endurecer as regras de concessão do BPC, que apresentou um crescimento de gastos de 16% nos últimos 12 meses até outubro.
Deputados da base governista expressaram preocupações sobre a estratégia do governo ao tentar economizar em um auxílio que beneficia pessoas carentes. A expectativa era de uma economia de R$ 2 bilhões por ano com o BPC, totalizando R$ 12 bilhões até 2030. O deputado Duarte Junior (PSB-MA) criticou a abordagem, afirmando: “Tem de cortar gastos, mas o caminho não é começar pelo BPC. É uma economia que não faz sentido para o governo federal, em detrimento das pessoas que têm direito”.
Em defesa das mudanças, o governo argumenta que as alterações no BPC visam combater fraudes e o que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chamou de “indústria de liminares”. O líder do governo na Câmara, deputado José Guimarães (PT-CE), reiterou que “não estamos retirando nenhum direito” durante a votação do projeto.
Com a proposta seguindo para o Senado, o governo enfrentou o risco de novas alterações, o que exigiria uma nova votação na Câmara. Os senadores se opuseram à regra que restringia o BPC a pessoas com deficiência de grau moderado ou grave, o que poderia resultar na negativa do benefício a indivíduos com deficiência leve, como em casos de autismo e síndrome de Down. Um acordo foi alcançado, e o Palácio do Planalto se comprometeu a vetar essa restrição.
Supersalários
Além das mudanças no BPC, os deputados também flexibilizaram a proposta que visava o fim dos supersalários no funcionalismo público. O texto original do governo proibia remunerações não previstas em lei complementar que fossem pagas fora do teto salarial, atualmente fixado em R$ 44 mil mensais. Essa limitação foi alterada para uma lei ordinária, que é mais fácil de ser modificada.
Bruno Carazza, professor da Fundação Dom Cabral e autor do livro “O País dos privilégios”, comentou que essa mudança pode permitir que resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) continuem a criar os chamados “penduricalhos”. Ele afirmou: “Há um entendimento bastante questionável do Judiciário de que resoluções do CNJ e do CNMP têm força de lei. Corre-se o sério risco de que eles continuem criando penduricalhos administrativamente”.
Emendas e outras medidas
No âmbito do projeto de lei complementar que integra o pacote fiscal, o Congresso também diminuiu outros quatro trechos e derrubou a possibilidade de o governo federal cortar emendas impositivas (não obrigatórias) para cobrir gastos obrigatórios e cumprir o arcabouço fiscal. Essas emendas são recursos indicados por parlamentares e bancadas estaduais que o governo é obrigado a pagar conforme a definição do congressista.
Durante a aprovação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que orientará o Orçamento de 2025, o Congresso rejeitou uma proposta semelhante, preservando as emendas, que devem ultrapassar R$ 50 bilhões no próximo ano. Outra proposta que foi rejeitada limitava a restituição de créditos tributários pelas empresas, enfrentando resistência de diversos setores da economia.
Por fim, os deputados revogaram a lei que instituiu o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), antigo DPVAT, o que resultou em uma diminuição da capacidade de arrecadação do governo federal.
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