Movimento de recursos para o exterior cresce 20% em dezembro, impulsionado por incertezas fiscais no Brasil
25 de Dezembro de 2024 às 12h31

Desvalorização do real provoca saída significativa de investimentos para os EUA

Movimento de recursos para o exterior cresce 20% em dezembro, impulsionado por incertezas fiscais no Brasil

A desvalorização do real, em meio a crescentes temores fiscais no Brasil e ao fortalecimento do dólar com a volta de Donald Trump à Casa Branca, resultou em uma saída em massa de investimentos do Brasil para os Estados Unidos. Esse fenômeno, segundo especialistas, pode se tornar uma tendência duradoura. Na corretora americana Avenue, que tem o Itaú Unibanco como sócio, o volume de transferências cresceu ao menos 20% em dezembro em comparação com novembro, um mês que normalmente apresenta baixa atividade devido ao período de festas.

Roberto Lee, fundador e CEO da Avenue, afirmou em entrevista que “quando a percepção de risco Brasil passou a ficar mais latente para o investidor brasileiro, houve um movimento em massa de recursos para fora. Já superamos novembro e, provavelmente, teremos um volume 20% a 25% maior em dezembro”. Ele observou que há uma mudança no perfil dos investidores que estão enviando mais recursos para o exterior, com um aumento significativo de um público mais conservador.

Historicamente, quando o dólar se valoriza, muitos investidores brasileiros tendem a acreditar que “perderam o bonde”. No entanto, para os investidores mais conservadores, a lógica é diferente. Eles seguem o movimento conhecido como “flight to quality”, ou voo para a qualidade, buscando opções mais seguras em tempos de incerteza. “Quando o dólar sobe, esse público conservador se movimenta apenas em momentos de insegurança. À medida que sentem mais risco, eles se deslocam”, explicou Lee.

Dos recursos que estão sendo enviados para os EUA, mais de 80% estão sendo aplicados em títulos superconservadores, principalmente em renda fixa de curto prazo. Esses investimentos incluem 'Treasuries', que são títulos do Tesouro americano, e dívida de empresas, conhecidos como 'bonds'. Lee destacou que os rendimentos desses títulos foram pressionados para cima desde a vitória de Trump, o que atraiu ainda mais investidores.

Dados do Banco Central indicam que o saldo de investimentos de brasileiros em ativos no exterior ultrapassou os US$ 10,6 bilhões até novembro, mais do que o dobro do registrado em todo o ano de 2023, que foi de US$ 4,511 bilhões. O recorde histórico foi de cerca de US$ 15,4 bilhões em 2011, conforme a base de dados do BC, que remonta a 1995.

A expectativa de que o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, não cortará os juros em 2025 também é vista como um fator positivo para a migração de recursos de brasileiros para os EUA. Contudo, o principal fator que ainda preocupa os investidores é a situação fiscal no Brasil, que se agravou após o pacote do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), considerado insuficiente para conter o crescimento da dívida pública, o que tem levado o Banco Central a adotar medidas mais rigorosas.

- CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE -

Na prática, os juros básicos elevados e as expectativas de novos aumentos deveriam ser um atrativo para manter os recursos no Brasil. No entanto, a aversão ao risco tem impulsionado o capital para fora do país. Em meio a preocupações fiscais, o Credit Default Swap (CDS) de cinco anos do Brasil, que mede o risco, foi negociado a 218 pontos na semana passada, o maior nível desde março de 2023.

Ele também mencionou que o volume atual de transferências que a Avenue, fundada há sete anos, está experimentando é “inédito”. Contudo, ele acredita que este movimento é estrutural e deve persistir, mesmo que a taxa de câmbio se estabilize. O trabalho realizado por instituições brasileiras sobre a importância da diversificação de investimentos no exterior tem contribuído para essa tendência. Lee enfatizou que a concorrência no setor financeiro tende a ser benéfica.

“Mais do que dobramos a custódia de ativos nos Estados Unidos, que já não era baixa, e isso foi bastante impulsionado pelo Itaú, especialmente no último trimestre deste ano”, acrescentou.

Se o ritmo observado nos últimos três meses do ano se mantiver, o montante de ativos sob custódia pode triplicar em 2025, de acordo com as projeções do CEO da Avenue. A corretora é a terceira fundada por Lee, que anteriormente criou a WinTrade e a Clear, vendida à XP em 2014.

O quadro de acionistas da Avenue também pode passar por mudanças no próximo ano, já que em dezembro de 2025 o Itaú terá o direito de assumir o controle da corretora, aumentando sua participação de 35% para 50,01%. Lee afirmou que os múltiplos já estão definidos em contrato. A base de acionistas inclui ainda o fundo japonês SoftBank e o Igah Ventures.

“O negócio com o Itaú foi um ganha-ganha. Todos precisam fazer o negócio acontecer. O banco precisa liderar e nós crescer. O banco nos transfere tecnologias e governanças que não se formam apenas por vontade, mas com muita estrutura”, concluiu Lee.

Caso o Itaú não adquira as ações remanescentes, como tem direito, o CEO da corretora reafirmou que o caminho natural seria a abertura de capital nos EUA em cinco anos, com a Nasdaq, a bolsa de tecnologia americana, como provável destino.

Veja também:

Tópicos: