Estudo revela que quase dois milhões de brasileiros enfrentam endividamento por conta das bets, impactando a economia.
17 de Janeiro de 2025 às 07h19

CNC aponta que apostas online causaram perdas de R$ 103 bilhões ao varejo em 2024

Estudo revela que quase dois milhões de brasileiros enfrentam endividamento por conta das bets, impactando a economia.

Um estudo recente da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) revelou que o varejo brasileiro deixou de faturar R$ 103 bilhões em 2024 devido ao redirecionamento de recursos das famílias para as bets, plataformas de apostas esportivas e de cassino online. A pesquisa, divulgada nesta quinta-feira (16) no Rio de Janeiro, destaca a magnitude do impacto financeiro das apostas na economia nacional.

De acordo com o levantamento intitulado O Panorama das Bets, os brasileiros destinaram cerca de R$ 240 bilhões às apostas online no último ano. A CNC afirma que esse fenômeno não apenas gera endividamento entre os apostadores, mas também provoca efeitos socioeconômicos significativos que afetam toda a sociedade.

A atuação das bets foi autorizada pela Lei Federal 13.756, sancionada em 2018, e desde então, o setor tem crescido exponencialmente no Brasil, investindo pesadamente em publicidade e patrocinando clubes de futebol. Contudo, a CNC expressa preocupação com as modalidades de cassino online, como o popular Jogo do Tigrinho, que dominam a maioria das plataformas de apostas. Economistas da entidade estimam que cerca de 80% dos pagamentos realizados pelos usuários estão relacionados a jogos de cassino, enquanto as apostas esportivas representam uma parcela bem menor.

Os economistas envolvidos na pesquisa ressaltam que a Lei Federal 13.756 ainda carece de regulamentação adequada por parte do Ministério da Fazenda. Eles apontam para um “limbo regulatório” que permitiu a proliferação descontrolada dos cassinos online, sem a devida supervisão.

O estudo destaca que a falta de regulamentação não só facilita a lavagem de dinheiro e outras atividades ilícitas, mas também prejudica a economia formal. A crescente popularidade dos cassinos online tem desviado recursos que poderiam ser investidos em setores produtivos, como o comércio varejista, afetando toda a cadeia econômica.

Além disso, a CNC estima que aproximadamente 1,8 milhão de brasileiros entraram em situação de inadimplência em decorrência das bets no último ano. Muitas pessoas acabam se endividando ao priorizar as apostas em detrimento de suas obrigações financeiras, um problema que afeta especialmente a população de menor renda.

O estudo analisa dados de inadimplência, comparando dois grupos de renda: o primeiro, com famílias que ganham entre 3 e 5 salários mínimos, e o segundo, entre 5 e 10 salários mínimos. Entre novembro de 2023 e novembro de 2024, o percentual de famílias com contas em atraso no primeiro grupo aumentou de 26% para 29%, enquanto no segundo grupo houve uma redução de 2,6 pontos percentuais, fechando em 22%. A CNC alerta que a alta inadimplência pode resultar em uma diminuição do consumo, desaceleração econômica, aumento da taxa de juros e instabilidade financeira.

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As preocupações em torno das apostas realizadas por beneficiários de programas sociais, como o Bolsa Família, ganharam destaque em setembro do ano passado, após uma nota técnica do Banco Central indicar que esses beneficiários haviam gasto R$ 3 bilhões em bets em um único mês. O governo federal anunciou medidas para aumentar o controle sobre as apostas, incluindo um pente-fino nos sites e o bloqueio de plataformas não autorizadas a operar no Brasil.

Recentemente, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o governo adotasse medidas para impedir que beneficiários do Bolsa Família utilizem os recursos do programa em apostas online, apontando um desvio de finalidade, uma vez que o programa visa garantir alimentação, saúde e educação às famílias atendidas.

O Tribunal de Contas da União (TCU) também cobrou soluções para a questão, mas o governo, através da Advocacia Geral da União (AGU), informou ao STF sobre limitações técnicas e dificuldades operacionais para cumprir a decisão. O caso continua em análise.

Por outro lado, o governo federal tem trabalhado na regulamentação do setor, resultando na Portaria nº 1.231/2024, que estabelece novas regras para a divulgação de informações aos apostadores, identificação de perfis e monitoramento de comportamentos, visando prevenir danos relacionados ao jogo patológico.

Além disso, foram impostas limitações à publicidade, proibindo propagandas que apresentem as bets como uma forma de enriquecer ou complementar a renda. O Ministério da Fazenda anunciou que o crédito para apostas foi proibido, permitindo apenas pagamentos pré-pagos, com o objetivo de garantir que os jogadores apostem apenas o que possuem, evitando o endividamento.

No estudo, a CNC defende a adoção de medidas regulatórias adicionais para mitigar os impactos sociais das bets, como a criação de limites de apostas, programas de prevenção e tratamento para viciados, e campanhas de conscientização sobre os riscos associados. A entidade também enfatiza a importância da arrecadação de impostos para financiar programas sociais e de saúde que possam compensar os danos causados pelo vício.

A CNC reiterou sua posição favorável aos cassinos físicos, que geram emprego e renda nas localidades onde são regulamentados, destacando a necessidade de uma regulamentação robusta para prevenir fraudes e proteger os jogadores contra a dependência. O estudo também apresentou comparações com experiências de outros países, como Estados Unidos, Reino Unido e França, ressaltando a importância de uma abordagem equilibrada para a regulamentação do setor.

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