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Venda de produtos com sabor de café gera preocupação na indústria brasileira
Indústria alerta sobre riscos de engano ao consumidor com produtos não tradicionais.
A comercialização de produtos que imitam o sabor do café, mas que não são feitos do grão tradicional, tem gerado grande preocupação na indústria brasileira. O alerta vem em um momento em que o preço do café torrado e moído verdadeiro atinge valores elevados nos supermercados, impulsionado por recordes nas cotações do mercado global.
O chamado "cafê fake", também conhecido como "cafake", é visto como uma "clara e evidente tentativa de burlar e enganar o consumidor", conforme afirma Celírio Inácio da Silva, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic). Em entrevista, ele destacou que a Abic identificou a venda desse tipo de produto em Bauru, interior de São Paulo, onde o pó é feito a partir de cascas, folhas e outras partes da planta, exceto a semente do café.
Um dos produtos em questão, denominado Oficial do Brasil, exibe em sua embalagem a frase "bebida sabor café tradicional", o que, segundo Silva, pode confundir os consumidores. Apesar de haver indicações de que não se trata de café torrado e moído, a similaridade da embalagem e o preço inferior podem levar à desinformação.
Recentemente, o café arábica atingiu uma máxima histórica na bolsa de Nova York, alcançando 3,8105 dólares por libra-peso. Essa alta é reflexo de uma safra frustrante no Brasil, que é o maior produtor e exportador de café do mundo, entre outros fatores de mercado.
A fabricante do Oficial do Brasil, a Master Blends, com sede em Salto de Pirapora (SP), defende que seu produto é um "subproduto" do café, conforme esclarecido na embalagem. A empresa nega qualquer intenção de enganar os consumidores, afirmando que nunca alegou que o produto é café puro.
“Em momento algum falamos que é café, criamos apenas um subproduto para atender uma classe que está sofrendo a cada dia que passa”, disse a Master Blends em nota. A empresa destaca que o produto é composto de café e polpa de café torrado e moído, com informações claras na embalagem.
A Master Blends também comparou sua situação a outros setores, mencionando que o que foi feito é semelhante a mudanças já observadas em produtos como leite condensado e bombons com cobertura de chocolate.
Desde o ano passado, a indústria de café torrado e moído tem repassado os custos da matéria-prima aos consumidores. A alta nos preços tem criado um ambiente propício para a comercialização de produtos "fakes", segundo Silva.
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“Estamos passando por um momento de muita tensão. Nunca vi preços tão elevados desde a geada de 1979. Isso faz com que a matéria-prima fique cada vez mais disputada e os industriais que adquirem a matéria-prima com esses preços vão repassar esses custos”, explicou.
A Abic expressou preocupação com a possibilidade de surgimento de novos produtos "fake" e já denunciou a situação ao Ministério da Agricultura e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), devido a questões de saúde e mercadológicas.
“É preciso ter autorização da Anvisa e comprovar a segurança alimentar”, afirmou Silva, ressaltando que a Abic já alertou o setor supermercadista sobre a inadequação desses produtos no mercado.
A Master Blends, por sua vez, afirma que possui a autorização da Anvisa para comercializar seu produto, e que não necessita do aval do Ministério da Agricultura.
De acordo com informações da coluna "Café na Prensa", publicada na sexta-feira pelo jornal Folha de S.Paulo, meio quilo do produto "sabor café" está sendo vendido em supermercados por 13,99 reais, um valor significativamente inferior à média do café tradicional, que gira em torno de 30 reais.
Essa não é a primeira vez que a Abic detecta a presença do "cafake" no mercado. No entanto, a entidade não registrava a venda de produtos com sabor de café desde 2022, conforme relatou um executivo da associação.
O dirigente da Abic também lembrou que a comercialização desses produtos contraria iniciativas da entidade, que anteriormente lançou um selo de pureza para evitar a venda de grãos moídos misturados com milho torrado, por exemplo.
“O Brasil mostrou que café não é tudo igual. Se não combatermos isso, as pessoas podem começar a consumir esse 'café' e afirmar que não gostam, o que pode levar à diminuição do consumo”, concluiu.
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