Médico é condenado a indenizar universidade em R$ 500 mil por fraude em cotas raciais
Decisão do TRF-5 determina ressarcimento por danos materiais e morais após ação do MPF contra ex-aluno da Ufal
O médico recém-formado Pedro Fellipe Pereira da Silva Rocha foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) a pagar R$ 500 mil à Universidade Federal de Alagoas (Ufal) por fraude no sistema de cotas raciais. A sentença foi proferida em resposta a uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF), que alegou que Rocha não apresentava características físicas que confirmassem sua autodeclaração como pardo durante o processo seletivo.
O julgamento ocorreu no dia 5 de outubro e a decisão determina que o médico deverá ressarcir a universidade em R$ 7 mil por cada mês cursado no curso de Medicina, que tem duração média de seis anos. Além disso, Rocha foi condenado a pagar R$ 50 mil por danos morais, totalizando a quantia de R$ 500 mil.
De acordo com o MPF, Pedro Fellipe Rocha ingressou na Ufal em 2017 utilizando a Lei de Cotas, que garante vagas em instituições federais para estudantes que se autodeclaram pretos, pardos ou indígenas. Na época de sua matrícula, a universidade ainda não contava com comissões de heteroidentificação, que foram implementadas posteriormente.
O MPF argumentou que Rocha não apresentava características físicas que corroborassem sua autodeclaração, como cor da pele, textura do cabelo e formato do nariz. “O rapaz não apresentava nenhuma característica física que confirmasse que ele era pardo, como havia declarado no momento da inscrição no Sistema de Seleção Unificada (Sisu)”, afirmou o órgão.
Além disso, o MPF destacou que a denúncia de fraudes nas cotas foi feita por alunos da própria Ufal, que alegaram que a instituição não tomou providências adequadas para investigar os casos. O coordenador do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas da Ufal, Danilo Luiz Marques, ressaltou que a comissão de heteroidentificação foi criada para combater fraudes e que as bancas são compostas por servidores, alunos e membros da sociedade.
As comissões de avaliação de candidatos cotistas foram estabelecidas nas universidades para evitar fraudes, mas enfrentaram críticas por serem vistas como um “tribunal racial”. As instituições defendem que esse mecanismo é apoiado por movimentos sociais, com o objetivo de garantir que as vagas reservadas sejam ocupadas por aqueles que realmente se enquadram nas condições das ações afirmativas.
O caso de Rocha não é isolado. Neste ano, a negativa de matrícula a um aluno que se autodeclarou cotista levou a Universidade de São Paulo (USP) a ser questionada judicialmente. O Supremo Tribunal Federal (STF) já havia ratificado a existência dessas bancas raciais em 2017, definindo que aspectos como textura do cabelo, cor da pele e características faciais devem ser considerados durante as avaliações.
Em 2021, o MPF ajuizou a ação contra Rocha, argumentando que sua autodeclaração era “ideologicamente falsa” e que ele não apresentava características fenotípicas que o tornassem potencialmente vítima de discriminação racial. A defesa do médico, que se autodeclara pardo, afirmou que ele sempre se reconheceu como tal e que sua participação no processo seletivo foi legítima, amparada pela legislação vigente.
A defesa também argumentou que não houve comprovação de danos materiais e morais à Ufal ou à sociedade, uma vez que Rocha seguiu todos os critérios estabelecidos pela legislação e pelo edital do processo seletivo. A advogada Paula Falcão Albuquerque, que representa o médico, declarou que a decisão judicial viola preceitos constitucionais e que a autoidentificação é um direito da personalidade.
O MPF, por sua vez, reiterou que a aparência física do candidato é fundamental para assegurar o direito à cota racial, uma vez que as características físicas são o que torna as pessoas negras (pretas ou pardas) vítimas de preconceito racial na sociedade brasileira. A decisão do TRF-5 marca um importante precedente na luta contra fraudes no sistema de cotas raciais e reforça a necessidade de mecanismos que garantam a integridade das ações afirmativas.
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