Força-tarefa resgata 163 trabalhadores em condições análogas à escravidão na BYD
Operação em Camaçari revela trabalho forçado e condições degradantes em obra da montadora de carros elétricos BYD.
Uma força-tarefa composta por órgãos federais resgatou 163 trabalhadores chineses que estavam em condições análogas à escravidão nas obras da montadora de carros elétricos BYD, localizada em Camaçari, na Bahia. A operação, realizada na manhã desta segunda-feira (23), foi conduzida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), Polícia Federal, entre outros órgãos, que identificaram situações alarmantes de trabalho forçado e condições degradantes.
Os operários, que atuavam em empresas terceirizadas, foram encontrados em alojamentos superlotados, onde um único banheiro atendia até 31 pessoas. Além disso, muitos deles dormiam em camas sem colchões e enfrentavam jornadas de trabalho que chegavam a 70 horas semanais, muito acima do limite legal de 44 horas no Brasil.
A fiscalização constatou que os trabalhadores estavam sob condições de extrema precariedade, com relatos de acidentes de trabalho, incluindo amputações. Um dos operários, que perdeu movimentos, afirmou que estava sonolento no momento do acidente, após longos períodos de trabalho sob o sol intenso.
Os alojamentos, que deveriam oferecer um mínimo de dignidade, apresentavam condições insalubres. A maioria dos trabalhadores não tinha armários para guardar seus pertences, e os alimentos se misturavam com roupas, criando um ambiente propício a doenças. A situação se agravava ainda mais pela falta de higiene nas cozinhas e banheiros, que frequentemente estavam imundos.
De acordo com a auditora fiscal Liane Durão, a operação foi desencadeada após denúncias de condições degradantes e agressões no canteiro de obras. “Com essa comparação, afastamos a justificativa muito usada de que a questão é cultural, pois há trabalhadores que gostam de dormir no chão”, afirmou Durão, referindo-se à comparação entre os alojamentos dos operários e os da equipe administrativa, que estavam em condições adequadas.
A BYD, que recentemente iniciou a construção de sua fábrica em Camaçari, foi responsabilizada pela situação, uma vez que a legislação brasileira exige que empresas contratantes garantam condições adequadas de trabalho, mesmo quando terceirizam serviços. O MPT já notificou a empresa e a Jinjiang Group, uma das empreiteiras envolvidas, para que apresentem medidas de regularização.
Os trabalhadores, que entraram no Brasil com vistos temporários de assistência técnica, estavam em situação irregular e enfrentavam restrições severas à sua liberdade. A retenção de passaportes e a exigência de autorização para sair dos alojamentos eram práticas comuns, o que caracteriza trabalho forçado, segundo a legislação trabalhista.
Além disso, a força-tarefa determinou que todos os salários e direitos dos trabalhadores fossem pagos, incluindo os 60% que deveriam ser entregues apenas após o retorno à China. Para aqueles que desejam voltar imediatamente, a empresa terá que arcar com as passagens, conforme prevê a lei brasileira.
Uma audiência na Justiça está agendada para o dia 26, onde serão discutidas as providências a serem tomadas para garantir a regularização da situação dos trabalhadores. O foco do MPT, segundo o subprocurador-geral do trabalho, Fábio Leal, é assegurar a saúde, segurança e direitos dos 163 operários resgatados.
A situação revela um problema mais amplo de trabalho escravo contemporâneo no Brasil, que, apesar da abolição formal da escravidão em 1888, ainda persiste em diversas formas. A legislação brasileira prevê punições severas para práticas que configuram trabalho forçado, servidão por dívida e condições degradantes, mas a fiscalização e a aplicação da lei ainda enfrentam desafios significativos.
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