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Governo federal busca solução para evitar aumento na tarifa de Itaipu
A tarifa de repasse da usina pode subir 6%, afetando consumidores do Sul e Sudeste.
O governo federal está elaborando uma estratégia para resolver o impasse relacionado à tarifa de Itaipu, após a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) estabelecer um prazo final para a questão. A medida visa evitar um aumento no valor pago por consumidores das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste pela energia gerada pela usina.
Se a proposta não for bem-sucedida, a tarifa de repasse do lado brasileiro pode sofrer um acréscimo de 6%, conforme cálculos da Aneel. Isso significaria que o Ministério de Minas e Energia (MME) não cumpriria a promessa de manter a cobrança em US$ 17,66 por quilowatt-mês (kW.mês), mesmo com o valor acordado de US$ 19,28 kW.mês com o Paraguai, que deve permanecer até 2026.
A diferença de tarifa tem sido compensada por um mecanismo de “cashback”, que permite o reembolso do valor pendente através de descontos nos investimentos feitos no Brasil pela usina. Contudo, esse montante não será suficiente para cobrir o déficit da conta de comercialização previsto para 2024. Além disso, o custo de cessão, que é a parcela adicional paga pelos brasileiros pela energia da usina que não é utilizada pelos paraguaios, também precisará ser equacionado.
Para evitar o aumento da tarifa, o governo pretende utilizar o “bônus Itaipu”, que ocorre quando a conta de comercialização de energia da hidrelétrica apresenta saldo positivo. Atualmente, a legislação exige que esse bônus seja repassado na forma de desconto para consumidores residenciais e rurais que consomem menos de 350 quilowatts-hora (kWh). Essa estratégia foi um dos fatores que contribuíram para a redução da inflação em janeiro.
O diretor-geral da Aneel, Sandoval Feitosa, assegurou que essa estratégia será mantida, e que apenas uma parte dos recursos que seriam convertidos em futuros descontos será utilizada para compensar o montante que falta na tarifa de repasse. Ele também informou que o MME já enviou um decreto que autoriza o uso de parte do total do bônus para validação pela Casa Civil.
“Esse bônus está mais elevado devido ao pagamento de parte dos recursos que foram adiados durante a Conta-Covid [empréstimo quitado antecipadamente]. No ano passado, tivemos um bônus de R$ 1,4 bilhão, e este ano também teremos valores semelhantes”, afirmou Feitosa a jornalistas.
A Aneel detalhou que os R$ 1,5 bilhão referem-se a uma disponibilidade de recursos que será disponibilizada ao longo de 2024, associada à recomposição de empréstimos realizados para distribuidoras nos anos de 2021 e 2022, não incluindo os R$ 1,3 bilhão que já foram distribuídos em janeiro.
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Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, considera que a medida é “neutra” para o consumidor, pois, se for implementada, não alterará o valor das contas de luz. Ele sugere que, se o governo quisesse reduzir a tarifa, poderia aumentar o cashback proveniente da diminuição dos repasses para obras socioambientais relacionadas ao orçamento da usina, mesmo que não estejam diretamente ligadas à hidrelétrica.
Sales também observa que a tarifa de Itaipu deveria ter diminuído com a quitação do financiamento da construção da usina, que ocorreu em 2023, o que não se concretizou. Ele ressalta que o valor destinado a essas obras não é administrado diretamente pelo governo brasileiro, sem passar por nenhum dos mecanismos de controle de recursos públicos.
Angela Gomes, diretora técnica da PSR, acredita que a redução das despesas discricionárias da usina é uma das opções a serem consideradas, e que, do ponto de vista formal, dependeria apenas de ajustes no orçamento do empreendimento. “Seria necessário refletir no orçamento quanto a parte brasileira pode investir em ações socioambientais e qual seria o valor do cashback”, avaliou.
A especialista ainda prevê que Itaipu continuará gerando “um pouco abaixo da média”, o que pode resultar em discussões semelhantes no ano seguinte, uma vez que o déficit está relacionado à geração da usina em 2024.
Em relação ao aspecto legal, a Aneel afirmou que o cálculo da tarifa bônus e a regra de repasse são fundamentados na Lei nº 10.438, de 2002, no Decreto nº 11.027, de 2022, e nos Procedimentos de Regulação Tarifária (Proret). As primeiras informações sobre o decreto para um uso diferente do bônus geraram dúvidas sobre a necessidade de alterações na legislação.
A advogada Laura Souza, do escritório Machado Meyer, esclareceu que a lei prevê apenas que “parcela” do resultado da comercialização de energia de Itaipu será destinada ao bônus, e que a legislação não menciona que é todo o resultado. “A lei fala que é mediante regulamentação do Poder Executivo”, completou.
Ela também destacou que o detalhamento é feito por decreto, de modo que um possível questionamento sobre a forma “não é uma tese que deve prosperar no Judiciário”.
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